Pesquisa da Uenf sugere uso de guimbas de cigarro na fabricação de tijolos de cerâmica

Pesquisa da Uenf sugere uso de guimbas de cigarro na fabricação de tijolos de cerâmica

Publicada no periódico internacional Construction and Building Materials, o estudo mostra que tijolos com até 5% de guimbas de cigarro têm resistência comparável aos tijolos de tradicionais

Por ano, 6,5 trilhões de cigarros são consumidos em todo o mundo. Apenas um terço desta quantidade é descartada corretamente, enquanto o restante é destinado ao meio ambiente. Com foco em solucionar adequadamente o destino das guimbas de cigarro descartadas no meio ambiente, após o consumo, cientistas da Uenf investigam a incorporação do material triturado em tijolos de cerâmica como uma solução sustentável ao seu fim.

Sobre este estudo, os pesquisadores de doutorado da UENF publicaram neste mês de outubro um artigo intitulado “A new proposal to reduce microplastics from cigarette butts: Production of eco-friendly fired clay bricks”, no periódico internacional Construction and Building Materials, hospedado na página Science Direct.
Resíduo produz tijolos mais leves e resistentes
O cigarro, após ser consumido, torna-se um resíduo sólido. Este resíduo é popularmente conhecido como ponta de cigarro, bituca de cigarro ou guimbas de cigarro (GC).

Segundo Cássio Rangel Paulista, um dos responsáveis pela pesquisa, testes mostraram que tijolos com até 5% de guimbas são mais leves, têm menor condutividade térmica e oferecem melhor isolamento acústico, além de manterem uma resistência comparável aos tijolos tradicionais. Além disso, a combustão das guimbas no processo de queima gera economia de energia.

Atualmente, sua equipe tem dado continuidade à pesquisa, com o apoio dos Laboratórios de Física (LCFIS) e Química (LCQUI) da UENF, para analisar a emissão gasosa de compostos inorgânicos e orgânicos durante o processo de fabricação.
Essa abordagem sustentável busca não só lidar com o descarte inadequado das guimbas, mas também contribuir para a construção civil com materiais de menor impacto ambiental.

“Apesar da existência das bituqueiras em diversos locais do país, a coleta de GC é um problema ainda não resolvido, pois elas continuam sendo dispersadas no meio ambiente e poucas são as propostas de melhoria do descarte. A gestão deste resíduo enfrenta desafios que precisam ser abordados para reduzir de forma considerável a poluição gerada pelas GC e alcançar a economia circular” ressalta o pesquisador.

Cássio destaca que sua equipe de doutorado, que foi orientada pelo professor Carlos Maurício Vieira (Laboratório de Materiais Avançados -LAMAV), ainda pretende desenvolver um equipamento simples e de baixo custo capaz de aspirar as GCs descartadas no solo.

“Queremos ainda sensibilizar os órgãos públicos e grandes empresas para que haja coletores espalhados na cidade. Por fim, é importante observar que o lixo possui o potencial de deixar de ser um problema para se transformar em uma fonte geradora de emprego e renda” destaca. A pesquisa também tem o professor Marcelo Gomes da Silva (LCFIS) como coorientador e a professora Maria Cristina Canela (LCQUI) como colaboradora.

Brasil é o 3º país que mais produz o resíduo no mundo

Estudos projetam um consumo mundial de 9 trilhões de cigarro em 2025. Já o mercado global de tabaco foi avaliado em 868 bilhões de dólares em 2022, com projeção de crescimento de 2,4% ao ano até 2030.

Atualmente, a China é o maior produtor e consumidor de cigarros do mundo. O país apresentou um consumo de aproximadamente 2,35 trilhões de cigarros em 2016. A capacidade produtiva chinesa de tabaco foi maior que 2,5 milhões de toneladas em 2019. Em segundo lugar está a Índia, com mais de 800 mil toneladas de tabaco.

O Brasil ocupa a terceira posição, com mais de 750 mil toneladas. No Brasil, 27,9 milhões de pessoas são fumantes e consomem cerca de 110 bilhões de cigarros por ano.

Descarte de guimbas é a fonte de resíduo pessoal mais comum

Cássio explica que, por ser de tamanho pequeno, não costuma-se dar importância ao descarte das guimbas de cigarro. Porém, as GC são a fonte de resíduo pessoal mais comum no mundo em número, sendo equivalente ao plástico em termos de quantidade de itens descartados diretamente no meio ambiente.

“As guimbas descartadas geralmente são encontradas no litoral de praias, clubes noturnos, pontos de ônibus, estradas e ruas, de forma difusa no ambiente. Estima-se que aproximadamente 1,2 milhão de toneladas de GC sejam descartadas no meio ambiente anualmente a nível mundial” diz.

A China é o país que mais gera este tipo de resíduo (35,8%), seguido da Índia (6,5%) e Estados Unidos (6,1%). O Brasil aparece na sexta colocação, com 3,1% da quantidade global. Há estudos que estimam um descarte diário de 34 milhões de GC em São Paulo e 20 milhões no Rio de Janeiro.

Estima-se que uma única guimba de cigarro pode contaminar até 1000 litros de água.

“Além disso, quando as GC são descartadas no meio ambiente, as chuvas podem arrastar estes corpos através de bueiros, cursos de águas locais e eventualmente para os oceanos. Com o tempo, as GC fragmentam-se em função das intempéries e se convertem em microplásticos — ou microfibras, especificamente — que podem se manter no ambiente de 10 a 15 anos. Esses microplásticos tornam-se, então, vetores de metais tóxicos e outros contaminantes” destaca Cássio.

O pesquisador lembra que a reciclagem de GC em tijolos de cerâmica vermelha foi inicialmente proposta a ele pelo professor Carlos Maurício.

“Após uma fase intensa de leitura e aprofundamento no tema, percebi a necessidade de buscar alternativas para o descarte de guimbas de cigarro, um resíduo altamente nocivo devido aos seus contaminante” diz.

Dados apontam que cigarros podem ter cerca de 7000 componentes químicos, incluindo alguns tóxicos e cancerígenos.